Esta foi a frase de Eduardo Cunha ao votar pelo impeachment de Dilma Rousseff. Nunca foi mais atual.
Ele sabia o que estava dizendo. Era preciso misericórdia: não com ela, mas com eles. Era preciso de Deus. Estado laico? Já se foi faz tempo. Não te avisaram? Você não deve estar no mesmo grupo de WhatsApp.
Na frase, digna de Nostradamus, ainda temos a nação. Mas o que é ela? Linhas imaginárias criadas sobre uma porção de terra pra chamar de fronteira. Delimitar pessoas, estabelecer o “nacionalismo”, a noção de que o seu gramado pode ser mais verde do que o outro.
Por que lembrar da frase de Eduardo Cunha? Porque Bolsonaro foi eleito.
Na icônica foto com o MBL e Eduardo Cunha ao centro, Bolsonaro já estava lá. Ao lado do notório corrupto.
Se teve uma coisa em que Cunha foi bom, foi em unir direita e esquerda contra um nome em comum: o seu.
Corrupto notório, não há provas de sua inocência em nenhum dos crimes que é acusado. Já foi condenado em alguns.
Cumpre, atualmente, prisão domiciliar e usa tornozeleira eletrônica.
Bolsonaro e Eduardo Cunha
Nos primeiros dias do novo governo Bolsonaro, ele já mostrou ao que veio: operar o projeto econômico neoliberal que já estava previsto desde a escola de Chicago.
Não à toa, o mercado chama Paulo Guedes de Chicago Boy. Boca grande este mercado.
Mas isto não seria um problema tão grande: é a agenda do mercado. Em nome do desenvolvimento, eles dizem. Desenvolvem shoppings, destroem casas. Desenvolvem estradas, destroem árvores.
Não existe desenvolvimento sustentável quando o mercado está com fome.
Boa parte da esperança daqueles que não o apoiam, residia no fato de que ele não cumpriria as suas promessas.
Não vai ser um louco, incitando ódio contra as minorias, não vai fechar o congresso, não vai aumentar o clima de tensão entre a população.
Mas já nos primeiros dias, mostrou que cumpriria as promessas, mas só algumas: como nomear Onyx Lorenzoni (gravado em vídeo assumindo o recebimento de propina) para ministro-chefe da Casa Civil, oficializar o nome de Paulo Guedes na pasta da economia, convidar Sérgio Moro para cumprir o governo, entre outros.
Já a esperança daqueles que o apoiam reside no fato de que ele vá cumprir as suas promessas: acabar com a corrupção, melhorar a segurança e livrar o país da “ameaça comunista”.
Mesmo que ele não tenha dito como faria qualquer uma destas coisas, nem mesmo pelo grupo de WhatsApp, as pessoas acreditaram que “tem que mudar isso daí”. De fato, todos concordam que tem que mudar. Mas para onde?
E mais: que ameaça comunista, cara pálida? Você já conversou com alguém que se diga comunista? Sabe o que eles pensam, de fato? Bastante improvável: é mais fácil julgar o livro pela capa. Neste caso, uma capa vermelha.
Em menos de uma semana de governo, aquele que dizia ser contra a corrupção, já nomeou Onyx Lorenzoni, mesmo que ele já tenha assumido ter recebido propina.
Já disse que o Ministério da Agricultura vai se fundir com o meio ambiente: o sonho dos latifundiários e o pesadelo dos ambientalistas.
É um posicionamento coerente, já que Bolsonaro tinha afirmado que a Amazônia “não é dos brasileiros”.
Tá certo, ela deve ser de Deus. Aquele que o Cunha pediu que tivesse “misericórdia desta nação”. Pelo visto, ele não ouviu o Cunha. Não houve misericórdia. Talvez, Deus tenha se concentrado em ouvir a população LGBTQI que, a partir da eleição de Bolsonaro, também implora por misericórdia. Pelas suas vidas. Para que não sejam ceifadas na próxima esquina.
Se as promessas serão cumpridas, ainda é uma incógnita. Deus deve saber.
Olhando pro passado, já se vê que alguns sentirão saudade do Temer. Outros tantos, do Lula. Por aqui, ficamos com Renato Russo: a saudade que eu sinto, de tudo que ainda não vi.
* Este é um texto do redator da agência e expressa somente parte da opinião da PFC.